N.E.R.D. - Necessitamos Escrever Repetidamente o Diferente




Após o surgimento da Apple e da Microsoft, o estereótipo de Nerd tem sido ainda mais fomentado. Não quero falar aqui exaustivamente sobre a data exata ou como ele começou, mas tentar propor novas implicações para esse termo.
O escritor de Sci-Fi Philip K. Dick diz ter criado o termo nurd em 1973, e parece ter sido derivado do termo "knurd", quer dizer, bêbado ao contrário, em inglês (drunk).
Embriague-se de vinho ou poesia, Baudelaire. O Brasil que deu certo nos obriga a beber? O mundo nos obriga a beber, correr contra o tempo, criar, produzir, preencher o engenho que não pára. Alguns preferem deixar isso de lado, fingindo que as indagações da cuca podem ser controlado. Quem faz isso, e não os julgo negativamente, quer apenas não sentir a dor do pensamento. A razão incomoda todo homem. É claro, quem é atormentado por matutações e decide não conviver com elas, mergulha mais do que os reclusos no #sextou, no #sabadou, no #sobrechurrascoas10damanhãnasegunda. E não é que os reclusos não o fazem. Eles fazem, embora não tanto. No entanto, esqueça aquela imagem do nerd recluso que traz traços permanentes do maníaco depressivo soturno que era Edgar Allan Poe ao escrever o poema O Corvo, eras atrás. O nerd já passou por diversas metamorfoses, as quais listamos aqui:

1 - Era o sujeito ligado quase sempre ligado à literatura soturna, que caminhou para a fantasia de terror (com Poe, Mary Shelley e o Frankenstein, Lovecraft).

2 - Passou a flertar com o futurismo, desde Julio Verne e as 20.000 léguas submarinas, Viagem ao Centro da Terra e Volta ao Mundo em 80 dias. O que seria da ciência sem o engenho e a ficção científica? O que seria o #segundou, #sobrebeberskol na segunda ouvindo um Sertão no Iphone se não fosse a curiosidade de um nerd?

3 - A Apple e a Microsoft ajudaram a injetar um nerdicida na sociedade. Os meninos da década de 60 a 80, aficcionados por quadrinhos, foram dando lugar aos retrôs, ou seja, os jovens que admiram quadrinhos e criam páginas no facebook sobre notícias de filmes de super-heróis, mas não leram tanto quanto liam os meninos de outrora.

É que os quadrinhos e filmes de hoje atendem tanto aos pais quanto aos filhos que usarão as camisas do Homem de Ferro. Mas ser nerd não é gostar de heróis, de robôs ou Aliens. Por que deveria ser ainda isso?
O conceito está se diluindo cada vez mais. Perdendo sua importância e seu potencial motivador para a necessidade de vender-se como produto ou artefato de decoração. O retrô deve chamar o nerd de Geek, deve incluí-lo na sociedade, não porque se preocupa com sua depressão ou isolamento criador.
A parada é mais embaixo. Achamos sim, muito divertido vestir camisas "segunda pele", gostamos dos canais do Youtube e dos filmes. A questão é que tem muita gente que sequer vê mais o Thor ou o as histórias de Júlio Verne e Asimov (quem são esses mesmo?) como impulso para criar ideias, fuçar no mundo e desenvolver novas formas e modos de vida. Claro, os grandes inovadores ainda estão por aí, embora geoprocessadamente direcionados nos escritórios do Facebook ou do Google. Conhecem toda a cultura motivadora que veio do Sci-Fi. Nós conseguimos ver elementos questionadores nas HQ's, colocamos bonecos na nossa mesa de trabalho. Mas até quando esse, que era um dos elementos de apego do intelectual (o fantástico ou o irreal como tubo de comunicação com um mundo imaginário no qual buscávamos soluções para a vida), viverá?
É muito lindo e elegante, divertido mesmo, ter um quadro cool do Laranja Mecânica no seu quarto ou a foto do Coringa do Heath Ledger dizendo que "algumas pessoas querem ver o circo pegar fogo" (que é na verdade uma apropriação da dublagem brasileira de uma tragédia ocorrida no Brasil no século XX).

A preocupação que fica, é justamente essa. Se o NERD, que agora é Geek (porque fica com garotas e sai de casa) se tornar um artefato de vaidade, um outdoor de classe, quem ganhará com ele no futuro será mais a área comercial de móveis planejados do que a ciência a qual ele fomentou por anos. Ninguém quer que você se trancafie no quarto e se vista como o Adamastor Pitaco. Nem sequer dizemos que um inteligente curioso deve ser anti-social ao extremo (O Sheldon Cooper de Big Bang Theory não é, ele é fofo, cute).
O que falta no Geek de hoje é a Síndrome do Incomodado, não a Síndrome de Aspenger. Saber da existência da fita cassete ou achar legal uma Kombi partida ao meio dentro do Shopping ou usada como Food Truck não te faz mais inteligente. A inteligência, por sua vez, não começa ou termina na quantidade de obras de Sci-Fi que você leu ou soube citar trechos depois de vasculhar a Wikipedia. Ela começa na sua curiosidade, a curiosidade que é bonita e ao mesmo tempo triste quando olhamos o rosto de Stan Lee, o bom velhinho de 90 e tantos anos que morrerá em breve e que tanto criou. Frank Miller, Alan Moore, Jack Kirby, Steve Jobs, Stephen Hawking (e até o King). Se não escrevermos repetidamente a nerdidade, quando surgirão os próximos? Ser nerd me parece ser "manter viva a criança", ente eterno da mente que cria. Você pode ilustrar a sua parede, fazer um canal do Youtube como muitos, mas, se seguirmos definitivamente e constantemente a Onda, veremos que a Kombi retrô é adorada como uns Deuses Americanos (na verdade, a Volkswagen é da Alemanha Nazista, que fez o Carro do Povo). E o Volkswagen, Kombi ou mobilete beautiful na sorveteria Gourmet, é apenas a representação da complexificação da nossa sociedade opressora, que nos obriga a projetar uma época de liberdade num passado relativamente recente, embora utópico. Nesse caso, a espuma do mar de iguais será o espermicida que minará nossas ideias.

Comentários